MANHUAÇU (MG) - O ano era 1896, e, de repente, no dia dez de maio, grande número de cavaleiros, em sua maioria armados, e sob o comando do Coronel Serafim Tibúrcio da Costa, Ex-chefe do Executivo (Prefeito) e Ex-presidente da Câmara Municipal, chegam e sitiam o município, em movimento que ficou conhecido como a ‘República Manhuassu’ e durou 22 dias, com o desfecho em 03 de junho.
Na época, Manhuassu (escrito com ‘ss’) era um município emancipado há pouco tempo.
Nascido em 1856, em Jequeri, na época distrito de Mariana (MG), Serafim Tibúrcio da Costa, tropeiro e vendedor de fumo, chegou a Manhuassu em 1880, ano em que ocorrera a primeira eleição municipal, que elegeu com Chefe do Executivo e Presidente da Câmara, Joaquim Gonçalves Dutra.
Doze anos após, em 1892, Serafim Tibúrcio da Costa torna-se o 4º Chefe do Executivo e Presidente da Câmara Municipal, governando por dois anos, até 1894. Nestes doze anos de estada em Manhuassu, Serafim ficou conhecido por sua atuação como coletor de impostos, habilidoso e próspero comerciante e delegado de polícia, além de obter o título de coronel. No entanto, também pesavam contra ele neste período denúncias de assassinato e outros crimes.
Em 07 de setembro de 1894, Coronel Serafim tentou a reeleição como governante do município, tendo como opositor o Vigário Odorico Dolabela, irmão do Coronel Frederico Dolabela.
Serafim teria vencido a eleição, mas não fora empossado. ‘Foi eleito pela Ata assinada pelos coronéis da cidade, o vigário Odorico Dolabela’ e ‘eleito pela maioria do eleitorado o coronel Serafim Tibúrcio com 636 votos de diferença’.
Na época, entendia-se que ‘de nada adiantava ser eleito pela maioria do eleitorado, sem ser aprovado pela maioria dos coronéis membros do conselho, pois a degola seria inevitável’, sendo considerada então a vitória do Vigário Odorico Dolabela.
Serafim Tibúrcio não se conformou com a derrota e partiu para a capital mineira para falar com o Governador do Estado, Crispim Jaques Bias Fortes. ‘Este, ao recebê-lo, também não lhe deu ouvidos, pois a legislação em vigor (Artigo nº 68), afirmava que “os Estados organizar-se-ão de forma que fique assegurada a autonomia os Municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse”.
Ao retornar, Serafim encontrou a região do Bairro Coqueiro completamente desabitada, pelo então Coronel Nicolau da Costa Matos (Ex-chefe do Executivo, o 3º Prefeito), nomeado delegado de polícia pelo novo Prefeito, o Vigário Odorico Dolabela. Os moradores do Bairro Coqueiro então seguiram Serafim Tibúrcio para fora do município, em entendimento que o coronel se mudaria para Caratinga de vez, dando término à sua vida política.
Serafim Tibúrcio manteve-se fora de Manhuassu por mais de um ano, até retornar em fevereiro de 1896, acompanhado de mais de vinte cavaleiros. Ele se apresentou à prisão a fim de ser submetido a julgamento em processo que contra ele tinha sido instaurado e em que fora pronunciado por crime de morte. Submetido o processo a julgamento, foi absolvido e relaxado da prisão. Permaneceu então na cidade, com os indivíduos que tinham vindo em sua companhia e fez entrar na cidade avultado número de capangas recrutados nas matas de Caratinga e Peçanha. Com este séquito, ameaçou e afrontou as autoridades da comarca fazendo passear armados de carabina e garrucha seus companheiros e amigos.
No dia 15 de Maio de 1896, a cidade já estava sob o domínio do coronel, que fechou as fronteiras do município, auxiliado pelos coronéis João do Calhau e José Bento Barbosa e outros da região, colocando seus capangas em pontos estratégicos impedindo a entrada ou saída de pessoas do município.
De acordo com o Historiador Ary Nogueira da Gama, diante da situação caótica, ‘o Ex-promotor Antônio Wellerson mandou seu cunhado Alceste Nogueira da Gama à capital mineira a fim de conseguir forças militares para expulsar da cidade os que estavam fora da Lei’.
O Governador do Estado, Crispim Jaques Bias Fortes, ‘enviou força policial de 25 praças que não chegaram a alcançar a região de Rio Casca, pois foi rechaçada. Mais tarde, novo contingente de cem homens foi enviado. Estes também não conseguiram penetrar, e, acabaram se deslocando para Carangola, onde tiveram a notícia de que Serafim Tibúrcio havia dominado a cidade e feito se aclamar governador ou presidente.
O Governador então pediu ao Presidente da República, Prudente de Moraes, o auxílio para derrotar as forças do Coronel Serafim.
As Forças Federais teriam ‘enviado então a ala do 10º Batalhão do Exército, composta por 110 soldados comandados pelo Major Nelson Nascimento Pereira, mais 71 soldados comandados pelo Alferes Speridião, além de outras tropas da região que, juntas, perfaziam um total de 312 homens, ficando alojados no município de Carangola’.
O Historiador Ary Nogueira da Gama evidencia que por não existir ligação férrea entre Manhuaçu e Carangola nesse período, os militares chegaram a cavalo ou a pé.
Ao tomar conhecimento desta nova força policial que tão logo chegaria, ‘Serafim Tibúrcio teria mandado seus capangas perseguirem e matar seus principais inimigos: Frederico Dolabela, Odorico Dolabela, Nicolau da Costa Matos, Leopoldo Nogueira da Gama, Cel. David Lopes Abelha, Ardelino de Carvalho e outros mais. Mas, estes, conseguiram escapar da perseguição’.
Ciente de que o número de soldados das tropas federais era bem maior que o de pessoas envolvidas com sua causa, ‘o coronel desiste de lutar e ordena aos revoltosos que partam em direção ao Estado do Espírito Santo’.
Sem possuir homens e armamentos necessários para atingir seus objetivos, a ‘República Manhuassu’ tem curta duração e termina com a invasão das tropas federais no Município, ‘encontrando a cidade quase deserta, restando apenas mulheres, crianças e alguns idosos’.
O Chefe de Polícia responsável pela ação, Alberto Diniz, telegrafou ao Secretário do Interior, Henrique Diniz, avisando o restabelecimento da ordem em Manhuassu, no dia 03 de junho de 1896, noticiando a retomada do poder municipal pelas autoridades ‘legalmente constituídas’ (Padre Odorico, Costa Matos, dentre outros).
O grupo dos Dolabela retornou ao poder público e o irmão do Vigário, Coronel Frederico Dolabela, acaba se tornando o prefeito (Chefe do Executivo Municipal e Presidente da Câmara), administrando o município por mais dois mandatos (1897 a 1905).
CENTENÁRIO DA MORTE DE SERAFIM
O Coronel Serafim Tibúrcio teria retornado raras vezes a Manhuaçu, aparecendo de vez em quando, por ocasião das eleições municipais. Antes de adoecer e se mudar para Espera Feliz (MG), ele morou em Afonso Cláudio (ES), retornando à vida política e elegendo-se vereador. Foi proprietário de terras e outros imóveis protagonizando muitas outras manifestações políticas, envolvendo novamente as tropas federais.
O ano de 2019 marca o centenário da morte do Coronel Serafim Tibúrcio da Costa, falecido em 19 de novembro de 1919, por morte natural, aos 68 anos, em Espera Feliz. Como a ferrovia já havia sido inaugurada em Manhuaçu (entre 1915 e 1918), o féretro veio da vizinha cidade transportado por trem de ferro. Registra-se grandioso número de pessoas presentes ao cortejo fúnebre até o cemitério municipal.
Em 1977, ano do centenário de Manhuaçu, foi esculpido busto em homenagem à memória do Coronel que, originalmente, seria colocado na Avenida Getúlio Vargas, no B. Coqueiro. No entanto, em razão de protestos de familiares do também saudoso Antônio Wellerson, a obra ficou guardada durante muito tempo aos cuidados da Casa de Cultura. Há alguns anos, o busto foi instalado na Praça Carlos Alberto de Castro, entre a Avenida Salime Nacif e a Rua Capitão Luiz Quintino de Souza, próximo ao Palácio da Cultura e à EE Antônio Wellerson, e lá permanece.
Atualmente, a Secretaria de Cultura e Turismo da Prefeitura de Manhuaçu, juntamente com o COMPAC (Conselho Municipal do Patrimônio Cultural), prepara o inventário para tombar como patrimônio histórico o busto do Ex-chefe do Executivo Municipal.
Também no Bairro Coqueiro, está situado logradouro que recebeu o nome de Rua Coronel Serafim Tibúrcio.
Thomaz Júnior – Fonte: ‘A República do Silêncio: Manifestações do Poder Local no Leste de Minas’, Cristina Miranda e do Jornalista Sebastião Fernandes