As mudanças da língua passam a valer a partir deste 1º de janeiro, embora haja um período de adequação às normas até dezembro de 2012. Até lá, as duas formas vão conviver em harmonia e as modificações não poderão ser cobradas em vestibulares, concursos e provas escolares. A reforma ortográfica vai afetar cerca de 3 mil palavras, o que eqüivale a 0,5% dos verbetes reconhecidos oficialmente no idioma brasileiro. Entre as principais alterações estão o aumento do alfabeto de 23 para 26 letras, com a inclusão do k, w e y; a extinção do trema; e a criação de novas regras de acentuação (veja arte).
O ponto mais polêmico da reforma, o hífen, é o único que ainda não está completamente definido. Apenas em fevereiro, quando a Academia Brasileira de Letras (ABL) deve divulgar um documento oficial, é que as regras de uso do famigerado tracinho serão esclarecidas. Até a publicação do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), vão permanecer as dúvidas e as controvérsias sobre quais expressões e verbetes devem ser separados por hífen e quais prefixos vão exigir sempre a presença do sinal gráfico.
ACORDO
As modificações fazem parte de um acordo ortográfico firmado em 1990 pelos integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)– Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné-Bissau. Anos mais tarde, o Timor Leste também assinou a unificação da língua. Mas os prazos de implantação das novas regras nunca foram cumpridos e o governo brasileiro sempre adiou as mudanças por falta de adesão de Portugal. Essa situação mudou em março, quando Lisboa anunciou o desejo de fazer parte da reforma. Em setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou decreto com o cronograma de aplicação do acordo no país.
As novidades, fundamentadas em 20 bases de mudanças, interferem apenas na grafia das palavras. Portanto, atingem em cheio as letras, acentos e sinais gráficos, como o hífen e o trema, mas não alteram em nada a pronúncia, a conjugação, a semântica e a didática da língua. A expectativa é de que a reforma favoreça a união entre os países de língua portuguesa e facilite a publicação de documentos oficiais em fóruns internacionais.
“O português é a única língua que, nos encontros da Organização das Nações Unidas (ONU), produz duas versões: uma no idioma do Brasil, outra no de Portugal. Mas a reforma mantém critérios de flexibilidade, ou seja, os portugueses vão continuar escrevendo ‘sector’, ‘acto’, ‘António’, enquanto nós usamos ‘setor’, ‘ato’ e ‘Antônio”. Portanto, não conseguimos padronizar, uniformizar a grafia das línguas”, diz a especialista em língua portuguesa Dad Squarisi, jornalista e autora de uma série de livros, entre eles o Manual de Redação e Estilo dos Diários Associados.
Segundo Dad, que também assina a coluna Dicas de Português do Estado de Minas e é editora de Opinião do jornal Correio Braziliense, os países lusófonos perderam uma boa oportunidade de realmente unificar o idioma. “Seria preciso mais negociação, discussão e entendimento entre as nações. Soube que, antes de assinar qualquer documento, o presidente Lula pergunta em que isso beneficia os pobres. Digo que a reforma não beneficia a língua, por não ter atingido seu objetivo, e ainda prejudica o pobre. Pais de família que fizeram enorme sacrifício para comprar um dicionário ou uma gramática para os filhos agora vão ter que jogar tudo no lixo”, lamenta.
Principais mudanças na ortografia
1 - Alfabeto:
entram k, w e y
2 - O trema desaparece:
frequente, tranquilo, lingueta, linguiça
3 - Sai o circunflexo do ditongo ôo:
voo, abençoo, perdoo
4 - Circunflexo do hiato êem desaparece:
veem, creem, deem, releem
5 - Agudo do u tônico dos verbos some:
apaziguar (apazigue), averiguar (averigue), arguir (arguem)
6 - O i e u antecedidos de ditongo perdem o grampo:
feiura, baiuca
7 - Ditongos abertos éi, ói viram ei, oi:
ideia, joia (o acento permanece nas palavras oxítonas e monossílabos: papéis, herói, dói)
8 - Os acentos diferenciais somem:
pelo, para, polo, pera (mantém-se o circunflexo de pôde e do verbo pôr)
Exigem hífen sempre:
Os prefixos seguidos de h: anti-higiênico, super-homem, micro-história, extra-humano, co-herdeiro, proto-história, sobre-humano, ultra-heróico
Exceção: subumano
Além, aquém, ex, pós, pré, pró, recém, sem, vice: Além-mar, aquém-muros, ex-presidente, pós-graduação, pré-primário, pró-reitor, recém-chegado, sem-terra, vice-presidente
Prefixos terminados em vogal seguidos por palavra começada pela mesma vogal: anti-inflamatório, auto-observação, contra-ataque, micro-ondas, semi-internato
Exceção: co- se junta ao segundo elemento mesmo quando ele começa com o:coordenar, coobrigação
Prefixos terminados por consoante seguidos de palavra começada pela mesma consoante: hiper-rico, inter-racial, sub-bloco, super-resistente, super-romântico
Sub usa mais um hífen - com a palavra iniciada por r: sub-região, sub-raça
Os sufixos de origem tupi-guarani açu, guaçu, e mirim: amoré-guaçu, anajá-mirim, capim-açu
Rejeitam o hífen
Prefixos terminados em vogal diferente da vogal que se inicia o segundo elemento: aeroespacial, agroindústria, antieducação, autoescola, coedição, coautor, infraestrutura, plurianual, semiopaco
Nos prefixos terminados em vogal que se juntam a palavras começadas por r ou s, duplicam-se o r e o s para manter a pronúncia: antirrábico, antirrugas, antissocial, biorritmo, contrassenso, infrassom, microssistema, minissaia, neossocialismo, semirrobusto, ultrarrigoroso, ultrassom