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Crônica de Manoel Lobato sobre Alto Jequitibá

13/01/2009 - Atualizado em 15/01/2009 00h08

Acabo de ler o livro "Alto Jequitibá", recém-lançado, que muito me comoveu. Seu autor é Ziba Alves de Assis, advogado em Divino, comarca no interior de Minas Gerais. Ziba é meu contemporâneo de internato no Colégio Evangélico de Alto Jequitibá que hoje é o Colégio Estadual Reverendo Cícero Siqueira. Fui para o internato no início de 1939 e saí no final de 1946. Lembro-me bem da chegada do colega Ziba. Ele, com voz grave, bem mais alto do que eu, exibia certa pose. Mais velho do que eu uns três anos, o colega me parecia que não topava muito as brincadeiras e nossas peraltices. Essa é a relembrança que guardo. Eu tinha 13 anos. Iria completar 14 em dezembro daquele ano, 1939. Fiz então o exame de admissão ao curso ginasial. Eu e Ziba não fomos colegas de turma porque ele chegou em janeiro de 1941, ano em que fiz o terceiro ano do curso ginasial.

Ziba Alves de Assis relata em linguagem correta e emocionada a história do lugarejo chamado Alto Jequitibá que se tornaria cidade, muitos anos depois. Era distrito de Manhumirim. O relato de meu colega tem laivos de reminiscências auto biográficas, pois o autor fala de sua vida estudantil. Ziba seria mais tarde professor de latim e de francês. O principal em sua obra é o destaque do casal Siqueira, a professora Cecília Rodrigues Siqueira e o reverendo Cícero Siqueira. Eu também fui aluno de dona Cecília. Ela lecionava português. No último ano do curso científico fui examinado em prova oral pelo reverendo Cícero Siqueira na disciplina de filosofia. O livro "Alto Jequitibá", de Ziba Alves de Assis é magistral. Nada vale meu palpite, senão como testemunho das realidades que o autor ressalta.

Em filosofia o termo "santo" (em latim "sanctus") designava o recinto consagrado aos deuses ao culto. O recinto destinado aos deuses chamava-se "fanum", daí a palavra "profanum", profano, como antônimo. Existe relação de sentido entre os vocábulos "santidade" e "divindade". O filósofo Kant destacava a santidade de Deus e a dos homens. A categoria dos numinosos seria exclusiva da religião. Diante disso, ouso afirmar que, no sentido filosófico, a professora Cecília e seu marido reverendo Cícero Siqueira foram revestidos de santidade, pois vieram ao mundo para educar, sempre servindo ao cristianismo.

Meu pai morreu quando eu tinha menos de sete anos. Meu irmão era mais novo do que eu. Tínhamos ainda duas irmãs. Todos nós quatro fomos internos - no Colégio Evangélico. Se não fosse a generosidade do diretor, reverendo Cícero Siqueira, com a anuência da igreja presbiteriana, mamãe não conseguiria pagar as despesas com os quatro filhos. Eu, meu irmão e nossas duas irmãs fomos internos e fizermos os cursos ginasial e científico em Alto Jequitibá. Meu irmão, já falecido, se formou em medicina. Minha irmã Clélia bacharelou-se em direito e a irmã Maria Angélica fez o curso de normalista.

Sei que muitos outros alunos também foram beneficiados pela direção do Colégio Evangélico de Alto Jequitibá. Ziba Alves de Assis cita alguns ex-alunos que se tornaram famosos. O autor menciona fatos curiosos em que se nota a vocação de educador nato do reverendo Cícero Siqueira. Transcrevo trecho do livro "Alto Jequitibá", início de um capítulo em que há referência à chegada do reverendo Cícero Siqueira ao lugarejo: "Eleito pastor da igreja presbiteriana de Alto Jequitibá, pela assembléia geral extraordinária, na reunião do dia 27 de abril de 1929, aqui chegando no dia 9 de agosto de 1929, logo a seguir tomou posse do cargo para o qual fora eleito. No dia 24 do mesmo mês e ano, assumindo o pastorado, lançou-se ao trabalho. Nele permaneceu até o final da vida em fevereiro de 1963, quando faleceu, por volta das 10 horas da manhã. A chegada do reverendo Cícero a Alto Jequitibá, como pastor da igreja, coincidiu com a crise do café, que deixou os fazendeiros do cultivo do café endividados. O café, único produto de exportação do Brasil, nessa época, perdera praticamente o valor".

Relembro algumas dificuldades do Colégio Evangélico, porque ele era combatido pelo padre Júlio Maria, vigário em Manhumirim, que fundou o jornal "O Lutador", hoje com sede em Belo Horizonte, e bem editado pelo padre Paschoal Rangel.

O livro de Ziba menciona alguns contemporâneos de internato, como Diógenes de Araújo Neto, Ibrahim Abi-Ackel, e tem um capítulo sobre o professor Jabes Werner que vive e reside em Alto Jequitibá. São citados ainda o jornalista Cyro Siqueira e Célio Siqueira que escreveu o livro "Cícero Siqueira, Forasteiro e Embaixador", síntese biográfica do pai. Cyro Siqueira mora em Belo Horizonte. Célio já faleceu. De acordo com relato de Ziba, nas solenidades prestadas ao reverendo Cícero Siqueira, em seu velório, o pronunciamento do padre Gláucio Vinício Coimbra destacou: "O homem vale pelo que é, pelo que pensa e pelo que faz. É preciso ter coragem para ser coerente. Sendo, pensando e fazendo dentro dos postulados da consciência. Dentro da linha das convicções o reverendo Cícero Siqueira merece nossa admiração, porque cremos que foi, pensou e fez como sua consciência e suas convicções reclamavam". O livro "Alto Jequitibá" foi publicado pela editora Juarez de Oliveira Ltda., rua Conselheiro Furtado, 648 - 1º andar - Liberdade - São Paulo/SP. CEP 015111-000.

MANOEL LOBATO escreve no Magazine diariamente, exceto às sextas-feiras. - Publicado 11/01/09 - O Tempo

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